Tava pensando aqui como as pessoas tornam as coisas tão complicadas. Neste exato momento minha avó tá fazendo barulho com o colírio na mão pra eu saber que tá na hora dela usar. E eu decidi que vou me fingir daquelas pessoas hiper compenetradas sem visão periférica e que não to percebendo nada disso porque acho que seria muito mais simples se ela me pedisse pra eu ajudá-la do que dar a entender isso implicitamente. E agora eu tô com ódio de mim por ser hipócrita demais falando de quem complica as coisas, sendo que também seria muito mais simples se eu tivesse levantado e colocado o colírio nela. 1 ponto pra vovó, porque ela acabou de levantar e deu um jeito de colocar sozinha. E 0 pra mim, que compliquei uma situação tão simples e to morrendo de vergonha que dá vontade de desistir desse texto agora mesmo.
Mas eu quero falar mais. Eu quero contar que eu acho que tô vivendo uma vida muito dentro de mim. Que meus pensamentos têm me sobrecarregado tanto que, por mais que eu esteja deitada no friozinho do meu quarto, eu tô tão atabalhoada de pensamentos que não me resta tempo algum pra estudar direito civil ou cumprir qualquer outra tarefa. E ninguém entende muita coisa e não faz a mínima ideia do que tá acontecendo. Meu pensamento vai embora tipo corrente e os problemas que mentalmente crio são tão urgentes que eu não posso me furtar de postergá-los e me preocupar em viver minha vida e cuidar das minhas obrigações. Tenho travado batalhas imensas entre minha racionalidade e meu lado sensível e, como eles não se dão bem de jeito nenhum, eu não consigo resolver e tampouco deixar de lado porque eles podem se acabar em porrada e de quebra acabar comigo também.
Pra quem olha de fora não entende bulhufas do cansaço que eu falo, da minha melancolia "sem motivo", do meu mau humor matinal. Não, eu não acordo de mau humor. É que logo de manhãzinha me certifico de receber uma dose diária de pensamentos profundos, problemas muito abstratos que eu faço questão de tê-los tão físicos que meu dia acaba às 10 da manhã sem dar uma chance sequer pro lado de fora me surpreender. A vida tá acontecendo, os amigos estão logo ali, as oportunidades idem, mas em uma recusa (in)consciente eu nego tudo isso pra desfrutar do silêncio do meu quarto e o barulho ensurdecedor da minha mente. Tenho problemas sérios.
E agora eu quero explodir essa casa com minha vó dentro, ainda que ela não tenha me feito nada, mas só por ter dedicado meus pensamentos em como ela consegue ser tão errada e patética. E choro porque meu namorado não decifra minha angústia nem minha mãe lê a aflição no meu olhar. E quero deixar de existir junto com esse texto pelo paradoxo de querer que as pessoas descubram a intimidade dos meus pensamentos, ainda que eu deseje que eles continuem íntimos. Ninguém pode descobrir a farsa que eu sou, o quanto eu sou 100 vezes mais louca do que eles pensam, nem detectar o quanto meus pensamentos são tão feios e mesquinhos que eu não mereço a doçura de ninguém. Ninguém pode saber, Deus o livre alguém saber. E é por isso que eu vou fingir que nada disso existe até que meu irmão pare de me olhar achando que já sabe de tudo. Olha pro lado oposto, procura alguma coisa pra fazer! Ignora os pensamentos de agora até que eles sejam questões palpáveis. Coisa que eu deveria ter feito há muito tempo. Tão simples...